Tuesday, March 18, 2008

Lampejos são lampejos.

Leminski é meio lampejo.

Sinapse aglutinação coerção.

Enforca as palavrinhas que gritam, se sacodem e mudam de densidade. Viram sempre coisa pouca.
Já era dia A simbiose quase vertia O sim da boca cheia De graça de cuspe selando a tarde vazia.
Que será que tu tem Tu que tem Tu que tinha Tu que tinha tudo e não sabia.
Rodopia sem gracejo Ponta de pé que vem Do relâmpago pro dedo: Tu danças como ninguém.
Agora me fita tá tudo bem Tudo cheira a alecrim Crina de vento Etér Eu Tu em mim.

Sunday, March 16, 2008

Os nós do mundo.

Cubra minha cabeça com o cobertor igual. Finjamos que os metros quadrados de colchão são nosso barco, na truculência das ondas sem mar.
Me chame de menina, ataque covardemente meu lirismo. Me peça coragem enquanto inflama o peito de fluoxetina.
Fale de guerras, exércitos, bravura - capa dura do livro de história - que carrega no corpo pesado. Suba na balança e anuncie: Perdi dois quilos. Dois quilos de alma, de pesar. Quase desconfiarei que irá querer dizer que está apaixonado.
Embale a turbulência de lençóis com música doce enquanto a voz preta de café procurará meus poros, inchados, fracos de tanto expelir.
Me chame de menina, devore meu lirismo com asco enquanto corto fatias do braço, expondo pus e revelando as goteiras do teto.
Arquitetarei uma fuga do barco. Colocarei os sapatos, irei desfazer o drama. Me chame de volta pra cama, me peça coragem enquanto armo meu peito de fraqueza.
Fraca que estarei, dias vivendo de puro arroz. Singela brancura do vazio que não nota. A-nota.
Sou sã. Sã do viés do tempo, do vil que ninguém viu, da anestesia local, do grito que se fantasia de lamento. Cale minha voz branda pedindo pra repetir o que disse. Não posso mais. O quê? Não posso, não poderei mais.
Quando será que irá se cavar esse poço entre seu terreno e meu travesseiro?

Escreve o que eu digo pra não esquecer: Ainda vai se afogar quando sair da cama.

Wednesday, March 05, 2008

Sentaram ao piano. Não vi quem foi, quem ousou. Do ângulo que via, só enxergava uns pézinhos balançando, que nem alcançavam os pedais.

A primeira nota surgiu: um ré. Tímido, gemido.
Gritaram dos fundos: "Toca que nem gente!"
Quem tocava quase acreditou ser possível tocar que nem qualquer outra coisa que não gente.
A segunda nota ecoou forte: um fá.
Quando pôs o fá-forte com o ré-arredio causou furor. Não em qualquer um que estivesse presente no empompado convescote, sim no diacho daqueles órgãos musicais que a gente tem - órgãos-platéias - que ou vibram, ou se contorcem, ou repelem.
A terceira nota era a que faltava: um lá.
Um lá tocado distraídamente, sem sentir o dente pesado do piano que obrigaria o sentimento a se camuflar de razão pra ser certeiro - no dente certo - e doído - no dente errado.

Ouviram todos os ministros, condes, viscondes e viscondessas pela primeira vez um Ré Menor tocado por um menino de 5 anos. O que sabem meninos dessa pequenez sobre rés menores?
Via-se nos rostos maquilados de porcelana, acetinados de saúde e enrijecidos contra emoções, a dor estampada. Entreolhavam-se todos, constrangidos por não conseguirem conter os órgãos-platéias dentro de si e as lágrimas que acumulavam na bochecha. Não choraram, não brigaram contra as pálpebras, mantiveram a fina compostura.

O menino, diante do escândalo, parou. Nunca mais conseguiu tocar. Um ré menor era por demais ameaçador para tanta convenção. E ele não sentira nada, coisa de criança. Tecla é tecla, som é som. Até ficava maravilhado com esse som que vinha de dentro da caixa preta cheia de cordas longas, longas, como fios do destino. Pra quem não entende o maquinário, o mundo faz sentido.

Sunday, March 02, 2008

Histórias de amor através da imagem hiperbolizada - cap.2

Leituras que descabelam os fios da razão.
Conversas solitárias que afastam os grilhões desse sentir que me disseram outro dia se tratar de 'nossa sensibilidade de quinta categoria'.
Adoraria fazer um épico. Mas agora estou aqui, na expressão máxima de tudo aquilo que me foi dado de herança pelos lemas mudos burgueses: trancada no cômodo da insegurança.
Tem gente que fala mais bonito dessa sensação. Talvez Drummond entenda melhor quando fala das coisas tangíveis que se tornam insensíveis à palma da mão.
E você, que agora está longe, costuma citar Brecht pra falar da imagem que me desestrutura. Aquele trecho lá, que fala da finitude e da mudança. Não ouso citar pois você o faz bem melhor.

A verdade é esta: nos perdemos numa briga árdua pra não aceitar, pra recusar coações, pra questionar, pra falar com voz suave sobre a bárbarie, pra desvendar as lacunas da palavra e as promessas das coisas que viraram gente e da gente que virou coisa. Briga dura.

Então, quando te digo que essa angústia me move e que me dá o ímpeto do primeiro pé pra fora da cama no morno surrealismo de nossos inconscientes, eu minto. Minto pra tornar mais fácil esse desespero todo. E se me permitir, finja que não confesso que eu finjo cá que não admiti. (já que agora tudo o que mais queria era ter por perto a tua voz que me contraria, pra poder continuar afirmando até perder a linha da discussão)

Queria ser artista e não ligar. Não sou. Sou gente comum que sofre de saudade.